Katherine Buso (*)
O Brasil, um dos maiores produtores e exportadores de milho do mundo, enfrenta um cenário desafiador em 2024, com estoques de milho já apertados e uma safra que depende da boa execução do plantio. A situação se torna ainda mais crítica com a previsão de estoques globais de milho em níveis baixos, o que coloca o Brasil em uma posição delicada no mercado global. A produção de milho do país, que já enfrenta dificuldades devido a fatores climáticos e logísticos, pode sofrer ainda mais com o ritmo lento do plantio, o que pode comprometer o abastecimento mundial.
A safra de milho no Brasil é dividida em duas colheitas principais: a primeira, que ocorre no início do ano, e a segunda, que representa quase 80% da produção total. Essa segunda safra, também conhecida como "safrinha", tem grande importância para o país e para os mercados internacionais. O Brasil, que desempenha um papel fundamental no abastecimento global de milho, especialmente para mercados como o da China, enfrenta um cenário de estoques muito apertados para o ciclo 2024-25.
Atrasos no Plantio da Safrinha: O Caso de Mato Grosso e Paraná
O ritmo de plantio da safra de milho no Brasil está mais lento do que o esperado, o que levanta preocupações sobre a produtividade final. O estado de Mato Grosso, responsável por uma parte significativa da produção, tem experimentado um dos piores ritmos de plantio desde 2011. Até o final de janeiro, apenas 1% da área destinada ao milho da segunda safra havia sido plantada, um dos piores índices dos últimos anos. Esse atraso é particularmente preocupante, já que o clima e o tempo de plantio são determinantes para a qualidade e a produtividade da colheita. Em anos como 2011 e 2021, o ritmo lento de plantio resultou em baixas produtividades, o que pode se repetir se os problemas persistirem.
O atraso no plantio de milho está diretamente relacionado ao atraso na colheita da soja, que, devido às chuvas fora de época, não foi colhida no tempo usual. Esse descompasso no calendário agrícola acaba comprometendo o início do plantio do milho, uma vez que a soja ocupa o solo onde o milho será semeado. Além disso, essa situação desloca a janela de formação do rendimento do milho, o que pode fazer com que o ciclo de crescimento coincida com o início da estação seca, prejudicando ainda mais a produtividade.
Mato Grosso é responsável por uma grande parte da produção de milho no Brasil, e a lentidão no plantio desse estado é um reflexo das dificuldades que o país pode enfrentar ao longo de toda a safra. Já o estado do Paraná, o segundo maior produtor, também apresenta dificuldades, mas com um ritmo de plantio mais próximo do normal. Até o final de janeiro, 9% da área prevista para milho havia sido plantada, mas o risco de geadas e danos por frio no final da temporada ainda é uma preocupação, especialmente em anos de plantio tardio.
Os Efeitos Climáticos e o Impacto da La Niña
O clima tem sido um fator determinante para o sucesso ou fracasso das safras de milho no Brasil. Embora o fenômeno climático La Niña, que é a fase fria do Oceano Pacífico equatorial, não tenha o mesmo impacto sobre os rendimentos do milho brasileiro que sobre as lavouras da Argentina, ele ainda pode afetar as condições climáticas no sul do país. No estado do Rio Grande do Sul, as condições climáticas semelhantes às da Argentina podem prejudicar os cultivos, mas o estado não é um grande produtor de milho da segunda safra, o que significa que o impacto não será tão significativo para a produção total do Brasil.
Por outro lado, os efeitos de La Niña são mais evidentes na Argentina, que já enfrenta seca severa, o que pode reduzir ainda mais a oferta de milho no mercado global. Embora o Brasil não tenha uma correlação tão forte entre o fenômeno e sua produção de milho, a ausência de uma boa safra argentina pode resultar em uma maior demanda pelo milho brasileiro, pressionando ainda mais os estoques do país.
Os Estoques de Milho no Brasil: Uma Situação Preocupante
O Brasil vive uma situação delicada em relação aos seus estoques de milho. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) estima que os estoques de milho do Brasil para a safra 2024-25 serão de apenas 2,1%, o que representa o menor nível em 42 anos. Essa queda drástica nos estoques é uma preocupação, pois os estoques baixos significam que o país não tem muita margem para erro. Qualquer falha na safra pode comprometer a capacidade de exportação e prejudicar o fornecimento interno.
A situação é ainda mais crítica quando se observa a queda nas exportações brasileiras de milho. Desde julho de 2023, as exportações caíram cerca de 29%, e as remessas para a China, que representaram 29% das exportações brasileiras de milho em 2023, caíram mais de 90% no período de julho a janeiro. Essa queda nas exportações não foi suficiente para aliviar os estoques internos, já que a demanda doméstica tem se mantido alta. O USDA prevê que os estoques de milho do Brasil para 2024-25 sejam de apenas 2,1%, um nível extremamente baixo, o que indica que o Brasil não pode dar-se ao luxo de cometer erros na sua produção.
A Competição com os Estados Unidos e o Papel da China no Mercado Global
A perda de mercado para a China tem sido uma preocupação para os exportadores de milho do Brasil, e isso pode beneficiar os concorrentes, especialmente os Estados Unidos. Juntos, Brasil e Estados Unidos respondem por cerca de 57% das exportações globais de milho. Com a queda nas exportações brasileiras para a China, os Estados Unidos têm se beneficiado de um aumento nas vendas para o mercado global, especialmente devido ao cenário de estoques apertados no Brasil.
Se a China voltar a comprar milho do Brasil, isso pode ser uma perda para os Estados Unidos, mas com estoques brasileiros tão baixos, a demanda chinesa pode fazer com que outros compradores se voltem para os Estados Unidos, especialmente se a safra americana se recuperar como esperado.
Conclusão: O Futuro do Mercado Global de Milho
O cenário para a produção de milho no Brasil em 2024 é de grande incerteza. A lentidão no plantio, os desafios climáticos e os estoques apertados indicam que o país pode enfrentar dificuldades para atender à demanda global. Qualquer erro na safra poderá resultar em perdas significativas para o Brasil, tanto no mercado interno quanto no externo. Com os Estados Unidos ganhando espaço no mercado devido à escassez de milho brasileiro, o Brasil precisará melhorar sua produção e aumentar a eficiência de suas exportações para não perder ainda mais participação no comércio global de milho.
O impacto dessa situação será sentido principalmente nos mercados internacionais, onde a demanda por milho continua a crescer, especialmente na China e em outros países importadores. O Brasil, portanto, terá que lidar com a pressão para garantir uma produção estável e evitar falhas que possam comprometer seu papel como um dos maiores exportadores de milho do mundo.
(*) Especialista em Economia e Assuntos Internacionais, Graduada com mérito acadêmico pela Faculdade de Economia da Universidade Armando Álvares Penteado (FAAP-SP) em 2014. Pós-graduada em Estatística pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Chile). Consultora Editorial na Ciência Capital. Colunista Internacional na Rádio Alta Potência. Colunista Internacional na Rádio Agro Hoje. CEO de Business Intelligence na BlueBI Solution em São Paulo.
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