Katherine Buso (*)
Nos últimos anos, a China tem sido uma das potências mais influentes no mercado global de grãos, sendo um dos maiores importadores de commodities agrícolas. No entanto, atualmente, o país está revisando suas estratégias de importação, o que pode ter implicações profundas para os mercados internacionais. A redução nas compras de milho e trigo, que já foram fundamentais para a segurança alimentar e a política econômica chinesa, está mudando o panorama do comércio global. Este artigo investiga as razões por trás dessa mudança, analisa os efeitos nos maiores exportadores, como os Estados Unidos e o Brasil, e projeta as consequências a longo prazo para o mercado global de grãos.
A Queda nas Importações Chinesas de Grãos: O Que Está Por Trás Dessa Mudança?
De acordo com as últimas estimativas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), as importações de milho e trigo pela China para a temporada de 2024-25 sofreram uma queda acentuada. O volume de milho importado foi estimado em 10 milhões de toneladas, enquanto o trigo ficou em 8 milhões de toneladas.
Esses números representam uma redução de 25% em relação às previsões anteriores e uma queda significativa em comparação com a média dos últimos quatro anos, sendo de 57% para o milho e 32% para o trigo.
Essa diminuição é ainda mais surpreendente quando se considera que a China enfrenta seus estoques de milho e trigo em níveis muito baixos, os mais baixos dos últimos dez anos.
No entanto, ao invés de recorrer ao mercado global para aumentar seus estoques, a China tem priorizado a produção doméstica, que, em 2024, atingiu níveis recordes. Isso levanta uma questão fundamental: por que a China, tradicionalmente uma grande importadora de grãos, está mudando sua estratégia?
O Crescimento da Dependência Chinesa: De Importadora Modesta a Maior Compradora do Mercado Global
Historicamente, a China importava volumes relativamente modestos de milho e trigo. Nos anos 2010, o país representava apenas 2% do total global de importações dessas commodities.
No entanto, a partir de 2020, as compras de milho dispararam, alcançando 29,5 milhões de toneladas na temporada 2020-21, consolidando a China como o maior importador global de milho.
Isso foi impulsionado por preocupações com a segurança alimentar, bem como por problemas de armazenamento e escassez de estoques internos.
Esse aumento na demanda se refletiu diretamente nas exportações dos Estados Unidos, que se beneficiaram enormemente desse novo mercado.
Os Estados Unidos se tornaram, então, um dos maiores fornecedores de milho para a China, embora a partir de 2023, a China tenha começado a diversificar suas fontes, incluindo o Brasil, o que ajudou a reduzir a dependência dos EUA.
O Impacto do Brasil: Emergente no Comércio de Milho com a China
A partir de 2022, o Brasil começou a aproveitar o aumento da demanda chinesa por milho, principalmente após a autorização oficial para exportações.
O Brasil rapidamente se tornou um fornecedor relevante no mercado chinês, mas em 2024, as exportações de milho brasileiro caíram drasticamente. Elas passaram de 29% do total de exportações para apenas 6%, uma mudança significativa que reflete a diminuição das compras chinesas, assim como uma possível mudança na preferência por outros fornecedores.
Além disso, os Estados Unidos também experimentaram uma queda nas exportações para a China, com uma redução de 50% em 2022-23 e outra queda de 60% em 2023-24, à medida que a China optava por diversificar suas compras e reduzir as importações globais.
O Que Está Motivando a Redução das Importações?
Vários fatores têm contribuído para essa diminuição nas importações chinesas de grãos. Em primeiro lugar, a produção doméstica de milho e trigo da China atingiu níveis recordes, o que permitiu ao país aumentar seus estoques internos. Além disso, a desaceleração do crescimento econômico chinês tem levado a uma redução na demanda interna por commodities agrícolas, pois o consumo de alimentos e rações também está diminuindo.
Outro fator crucial é a intervenção do governo chinês. Em 2024, o governo solicitou que os comerciantes limitassem as importações de milho, cevada e sorgo, com o objetivo de proteger os agricultores locais e reduzir o excesso de estoques. Essa política tem sido um dos principais impulsionadores da queda nas importações.
O Efeito da Redução nas Importações para os Exportadores Globais
A diminuição da demanda chinesa pode ter consequências significativas para os exportadores globais de grãos.
Os Estados Unidos e o Brasil, que tradicionalmente dependem da China como um mercado chave, terão que redirecionar suas estratégias, buscando novos mercados ou ajustando sua produção para atender a essa nova realidade. Além disso, a redução das compras da China pode afetar os preços globais dos grãos, especialmente se outros grandes importadores não aumentarem suas compras para compensar a queda da demanda chinesa.
No entanto, alguns analistas acreditam que a China pode retomar suas importações no futuro, especialmente se seus estoques domésticos começarem a diminuir.
O comportamento dos preços futuros de milho tanto no mercado chinês quanto no de Chicago sugere que ainda há uma interdependência entre os mercados, com a China desempenhando um papel fundamental na formação dos preços globais.
O Futuro do Comércio Global de Grãos
A China está, sem dúvida, reconfigurando sua posição no mercado global de grãos, mas isso não significa que seu impacto tenha desaparecido. Com estoques elevados e uma produção doméstica em crescimento, o país está optando pela autossuficiência. No entanto, a volatilidade da demanda e as políticas governamentais continuarão a ser fatores-chave que os exportadores precisarão monitorar.
Para os principais fornecedores de grãos, como os Estados Unidos e o Brasil, a adaptação a essa nova realidade será fundamental. Será necessário diversificar os mercados e fortalecer as relações comerciais com outros parceiros para garantir a sustentabilidade de suas exportações.
O futuro do mercado global de grãos dependerá não apenas da China, mas também da capacidade dos exportadores de se ajustarem a esse cenário em constante mudança, garantindo que possam continuar a prosperar mesmo diante de desafios inesperados.
(*) Especialista em Economia e Assuntos Internacionais, Graduada com mérito acadêmico pela Faculdade de Economia da Universidade Armando Álvares Penteado (FAAP-SP) em 2014. Pós-graduada em Estatística pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Chile). Consultora Editorial na Ciência Capital. Colunista Internacional na Rádio Alta Potência. Colunista Internacional na Rádio Agro Hoje. CEO de Business Intelligence na BlueBI Solution em São Paulo.
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